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Reflexão de Matias Spektor publicada na Folha de São Paulo. Cópia do telegrama enviado ao Ministro das Relações Exteriores.


Boa luta


O problema do Itamaraty está, em parte, no seu próprio modo de interação com a opinião pública

Há mais de ano, a imagem de uma Dilma intolerante em face de um Itamaraty prostrado abriu temporada de golpes contra o ministério.

Os ataques cresceram nas últimas semanas, com notícias de abuso de passaportes diplomáticos, super salários, diplomatas-fantasmas, a possível suspensão do concurso do Instituto Rio Branco e a leniência diante de uma grave acusação de assédio.

Se as denúncias em si são bem-vindas, o burburinho de onde se originam tem bafo de injustiça.

Afinal, a ordem para emitir passaportes diplomáticos vem de cima.

Na lista divulgada de funcionários-fantasmas, tem gente em trânsito normal para posto no exterior.

E, embora existam casos de salários nababescos em todo o serviço público, a maioria dos diplomatas brasileiros não vive na opulência.

Com apenas 1% do Orçamento federal, o Itamaraty está longe de ser perdulário. Faz milagre.

O tatibitate mais recente também traz algumas inverdades, como o suposto descaso diante da prisão de brasileiros na Bolívia. Nesse quesito, a diplomacia tem feito um trabalho verdadeiramente exemplar.

Dadas as circunstâncias, bem que o Itamaraty podia reagir com uma ofensiva de caráter tribal. Não para calar as críticas, que são essenciais, mas para tirar o debate público sobre política externa do fundo do poço em que se encontra.

Basta abrir as principais revistas e jornais do país para saber que é urgente restaurar o embate de grandes ideias a respeito dos desafios diplomáticos do Brasil.

Em parte, o problema atual está no próprio modo de interação do Itamaraty com a opinião pública.

Sem política de comunicação social, o ministério usa instrumentos ultrapassados para divulgar sua mensagem.

O contato com a imprensa, por exemplo, é concentrado no topo, modelo que funciona somente quando há material e disposição abundante para alimentar uma imprensa faminta. Quando a informação é distribuída a conta-gotas, no entanto, esse modelo apenas estimula vazamentos.

Sem material para trabalhar, jornalistas fracos reproduzem fuxicos, ao passo que os bons correm por fora, garimpando pautas em arquivos ou consultando fontes estrangeiras.

Além disso, os embaixadores brasileiros que poderiam estar operando a imprensa cotidianamente são orientados a evitá-la e a deixar tudo na mão do QG, em Brasília.

No ministério, o medo generalizado dos meios de comunicação produz também certo desprezo por jornalistas. Nesse jogo, o Itamaraty sempre sai perdedor.

O problema está bem ilustrado no uso que o ministério faz de Facebook e Twitter: ignorando a lógica dessa tecnologia, mantém a velha prática de notas áridas que pouco explicam e nada discutem. Idem no YouTube.

Se o Itamaraty aproveitar esta conjuntura negativa para sacudir a poeira, renovar as armas e partir para a boa luta, receber tantos golpes não terá sido em vão.

Ninguém sabe ao certo quantos brasileiros vivem nos Estados Unidos, mas é bem menos que os 2,5 milhões que escrevi na última coluna.




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