E há outro excelente caminho para boas matérias - um caminho difícil porque está totalmente minado por fundamentalismos ideológicos, mas que é preciso desbravar. Quando Evo Morales chegou à Presidência da Bolívia, a produção de coca do país tinha sido muito reduzida, com a colaboração da DEA (Drug Enforcement Agency) americana. Nada que tenha afetado o abastecimento internacional: outros países ampliaram a produção de cocaína e se responsabilizaram pelo fornecimento aos grandes mercados, especialmente o americano.
Evo permitiu um grande aumento na produção boliviana de coca. De 25 toneladas de pasta-base de cocaína por ano, quando tomou posse, a Bolívia passou a 300 toneladas anuais. E surgiu um problema sério: os mercados tradicionais da Bolívia já tinham novos fornecedores. Houve então amplo trabalho para transformar o Brasil, antes apenas um caminho para o escoamento das drogas, em destinatário final. Isso explica o rápido crescimento do consumo, percebido pela ONU.
É reportagem cara, que exige viagens, exige pesquisa documental, exige uma imensa paciência com os patrulheiros que acusarão o repórter de ser da zelite e de desconhecer o importante aspecto cultural do cultivo da coca na Bolívia. OK, o argumento pode ser ótimo - mas o que se discute é o uso da cocaína no Brasil, não a importância cultural do cultivo da folha de coca na Bolívia.
E, claro, é essencial discutir como enfrentar a epidemia de drogas. A tática de guerra, hoje utilizada, mostrou-se exigentíssima em recursos e em sangue, e deu resultados pequenos. Haverá outra maneira de enfrentar o problema? Será a liberação das drogas uma resposta à criminalidade, que extrai da ilegalidade os fundos que a sustentam? Haverá alguma solução diferente dessas? É outro bom tema de reportagem, até agora tratado apenas com declarações pró e contra. Mas como, numa época de recursos contados, partir para reportagens de alto custo?
O caminho do dinheiro - Carlos Brickmann
Fonte: Observatório da Imprensa, Circo da Notícia, 11 de março de 2014